“Um filme mudo de dança, acentuado por um disco”
Arrojado álbum conceitual de Sufjan Stevens dá origem a um "híbrido delicado", que mistura dança moderna, musical e ópera rock
Uma apresentação de dança moderna, um musical da Broadway, uma ópera rock para o século 21, tudo junto e misturado, numa só coisa.
Assim é Illinoise, adaptação de Illinois, o arrojado e celebrado álbum conceitual e semi-autobiográfico de indie-folk lírico que o cantor-compositor americano Sufjan Stevens lançou em 2005, atual sensação em Nova York, onde está em cartaz.
Ou, como descreveu o próprio diretor e coreógrafo do espetáculo, Justin Peck, ao diário britânico The Guardian, “um filme mudo de dança, acentuado por um álbum”.
Não é incomum a fusão de artistas de música pop com Broadway. Exemplos recentes são Hell’s Kitchen, onde as canções de Alicia Keys ajudam a contar um pouco de sua vida, e Here Lies Love, o musical de David Byrne e Fatboy Slim sobre Imelda Marcos, a ex-primeira dama das Filipinas. Mas Illinoise é uma criatura à parte, “um híbrido delicado”, na definição do jornal The Los Angeles Times. Ou, então, um “híbrido bizarro”, como prefere o The New York Times.
Ao contrário do que ocorre nos musicais tradicionais, o elenco de Illinoise é formado por bailarinos que não cantam. Eles não têm falas, interpretam seus papéis apenas com gestos e dança, tendo como base a narrativa elaborada pelo dramaturgo Jackie Sibblies Drury a partir da música do disco, cantada e tocada ao vivo por 11 instrumentistas e três vocalistas vestindo asas de borboleta (Elijah Lyons, Tasha Viets-VanLear e Shara Nova, todos veteranos do álbum original) numa plataforma situada na parte mais alta do palco.
Dedicado ao estado de Illinois, o álbum de Sufjan embola personagens históricos (dentre eles, o assassino em série John Wayne Gacy Jr., que aterrorizou Chicago nos anos 1970) e referências locais (a torre da Sears é uma delas) numa série de 26 músicas que navegam por sentimentos como descoberta, amor, auto-aceitação e perda, e tornou-se uma das obras mais importantes do artista de 48 anos.
No palco, Ricky Ubeda é o protagonista de um roteiro sem uma única palavra falada, com coreografias que envolvem outros 12 bailarinos. Cada música do espetáculo é apresentada por seu título, mostrado num painel. As emoções das canções são expressadas com o corpo, exclusivamente. Como quando na abertura, quando Henry (Ubeda) se despede de seu namorado e deixa Nova York, a caminho de Chicago, deslanchando toda a ação.
Prova de seu sucesso e de seu impacto, Illinoise acaba de ser indicado ao prêmio Tony, o principal das artes cênicas americanas, e em diversas categorias: Melhor Musical, Melhor Coreografia, Melhor Design de Luz e Melhores Orquestrações.
Ironicamente, nenhuma das indicações ao prêmio Tony inclui Sufjan Stevens – que, na verdade, não teve envolvimento algum com a produção, além de dar sua benção ao projeto. Ele mantém, no entanto, a autoria de um ponto-de-partida estimulante e inspirador que está entre os clássicos do pop e do rock.
Illinois
O álbum-marco de Sufjan Stevens
Qual era o cheiro da União Soviética? Cem obras de Salvador Dalí chegam a São Paulo. Um século de cinema pernambucano ganha livro. ‘Mona Lisa’ pode ter sala exclusiva. E trecho de documentário sobre Anita Pallenberg mostra viagem de navio com Mick, Keith e Marianne Faithfull, de Lisboa ao Rio de Janeiro.
– Qual era o cheiro da antiga União Soviética? Esta é a pergunta que o historiador alemão Karl Schlögel busca responder em seu ensaio, O Aroma dos Impérios. No texto, ele mergulha fundo na indústria soviética de perfumes e em sua relação com o mercado internacional – em especial, com a França. E traz curiosidades, como a mudança dos nomes dos perfumes na medida em que foram “bolcheviquizados”: o que se chamava Aroma de Amor passou a ser conhecido como Pioneiros, ou Sindicalidstas, ou, ainda, Nossa Resposta Aos Camponeses de Koljós.
– Cem das obras mais importantes de Salvador Dalí, o mestre catalão do Surrealismo, estão na mostra Desafio Salvador Dalí: Uma Exposição Surreal, aberta ao público na Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP), em São Paulo, a partir desta semana, cobrindo a trajetória do artista desde os 16 anos de idade. Além de quadros como Construção Suave com Damascos Cozidos (1936) e O Cristo de São João da Cruz (1951), a exposição, distribuída em seis áreas, reúne também criações de Dalí em ourivesaria, para o cinema e para publicidade, e oferece experiências de imersão através do uso de Realidade Virtual e de um áudio-relato sob a forma de podcast.
– Um século de atividade audiovisual em Pernambuco é o tema do novo livro dos jornalistas Germana Pereira e Ernesto Barros. Em suas 153 páginas, História Ilustrada dos 100 anos do Cinema em Pernambuco – que sai em maio – percorre diferentes períodos, a começar do Ciclo do Recife (1923-1931), até chegar aos dias de hoje, povoados pelos filmes de realizadores como Kleber Mendonça Filho e Renata Pinheiro.
– A Mona Lisa, obra icônica de Leonardo da Vinci, pode vir a ter sua própria sala no Museu do Louvre, onde é vista por uma média de 20 mil pessoas por dia – o equivalente a 80% da visitação. Atualmente exposta na Sala dos Estados, a maior do museu, a pintura ganharia um espaço exclusivo, medida que a diretora do Louvre, Laurence Des Cars, está discutindo com o Ministério da Cultura francês.
– Catching Fire, o documentário sobre Anita Pallenberg, atriz e modelo que Keith Richards roubou de Brian Jones em 1967 para passar com ela os 13 anos seguintes, estreia em maio (nos Estados Unidos e na Europa) e vem repleto de imagens inéditas. Dentre elas, trechos de Super-8 rodados a bordo do Arlanza, navio que em dezembro de 1968 levou Anita, mais Keith, Mick Jagger e Marianne Faithful de Lisboa ao Rio de Janeiro, onde todos se hospedaram no Copacabana Palace antes de partirem para o interior de São Paulo, onde nasceu o embrião de “Honky Tonk Women”. No documentário, narrado na primeira pessoa, Scarlett Johansson empresta sua voz a Anita, morta em 2017, aos 75 anos. Assista, abaixo, a um clip mostrando essa travessia do Atlântico.
PLAYLIST FAROL 81
Paul McCartney e Wings, ao vivo no estúdio. Neil Young e Crazy Horse regravam seu próprio disco. A sabedoria e a maturidade de David Gilmour. Will Gregory Moore toca em sintetizadores a matemática de Arquimedes. O pop “uêive” do canadense Bon Enfant. Joanna Serrat combina Catalunha e Irlanda. As Rainhas Zawose misturam música eletrônica e tradição africana. Valnei Ainê + Os Paralamas do Sucesso. O vozeirão solo de Bernard Butler. E David Byrne retribui uma gentileza ao Paramore.
Paul McCartney, Wings – “Junior’s Farm” – Lembra que falamos aqui neste FAROL, na semana passada, do One Hand Clapping, projeto de Paul McCartney que era para ter sido um documentário e um disco ao- vivo-no-estúdio feitos para badalar o álbum Band On The Run, lançado por Macca e seu Wings em 1973, mas que acabou não concluído? Pois bem, a parte musical do projeto sai em junho, e aqui você pode ouvir como amostra uma versão sanguínea, vigorosa, de uma canção que acabaria sendo presença constante no setlist dos shows de Paul.
Neil Young, Crazy Horse – “To Follow One’s Own Dream (Days That Used To Be)” – Conte com Neil para tirar da cartola uma supresa inusitada. Ele resolveu regravar as músicas do álbum Ragged Glory, que fez em 1999, acompanhado pelo mesmo grupo Crazy Horse de então. O resultado chama-se FU##IN’ UP e saiu na semana passada.
David Gilmour – “The Piper’s Call”– David mostra a primeira faixa de seu quinto álbum solo, Luck and Strange, que sai em setembro. Com forte parentesco com a sonoridade anos 1990 do Pink Floyd, falando da sabedoria necessária, adquirida com a passagem do tempo.
Will Gregory Moore– “Young Archimedes” – Moore se afastou do tecnopop do Goldfrapp para criar um projeto de música eletrônica neo-clássica inspirado nos trabalhos de Arquimedes, o matemático grego, feito a partir de sintetizadores vintage –Minimoog, Moog Voyager, Korg 700s, Prophet 6 e Roland JX-3P – junto com a Orquestra Nacional do País de Gales da BBC.
Bon Enfant – “Tromp-l'oeil”– O quinteto canadense faz um pop “uêive” em francês que é tão inteligente quanto contagiante.
Joanna Serrat – “Are You Still Here?”– A cantora-compositora catalã acrescentou a seu folk-rock a guitarra de Joey McClellan – hoje no prog-folk Midlake – e , assim, obteve um quê de Irlanda em sua música, hoje mais ampla e mais pop.
The Zawose Queens – “Maisha” – Sons eletrônicos e instrumentos tradicionais da África se misturam num disco gravado na Tanzania, a estreia desta dupla de mulheres da família de Hukwe Zawose, um dos músicos mais importantes de seu país.
Valnei Ainê, Os Paralamas do Sucesso – “A Letra Perfeita”– A convivência musical do trio carioca com o artista de reggae vem de longa data. Herbert Vianna produziu no estúdio o Negril, grupo do qual Valnei era vocalista. E Ainê mais tarde viria a integrar o projeto "Reggae B", idealizado por Bi Ribeiro. Juntos aqui, acrescidos de João Barone na bateria, celebram o poder – e a responsabilidade – do ofício (e da arte) da composição.
Bernard Butler – “Camber Sands” – O ex-guitarrista do Suede está lançado seu terceiro álbum solo – 25 anos depois do anterior. No novo Good Grief ele continua exercitando seu lado cantor, com um vozeirão grave, maduro e de emoção profunda.
David Byrne, Paramore – “David Byrne Does Hard Times” – Depois que o Paramore regravou um clássico do Talking Heads, “Burning Down The House”, Byrne retribui a gentileza, juntando-se ao trio para criar uma nova versão de uma música do repertório deles.