No estúdio com a Legião Urbana
Com novas entrevistas, livro revisita a gravação do álbum de estreia do grupo de Brasília, 40 anos atrás – e documenta o princípio de sua transformação num fenômeno do pop e do rock
A mensagem na secretária eletrônica me esperava, impaciente, na volta do feriadão: “a Legião Urbana já está no estúdio”.
Era a senha para partir em direção ao QG da EMI-Odeon, no coração de Botafogo, Zona Sul do Rio de Janeiro, e mergulhar na experiência transformadora – para todos envolvidos – de se gravar o álbum de estreia do grupo de Brasília, que este ano comemora quatro décadas de lançamento.
Foram meses de ralação, descobertas, aprendizado, ranger de dentes e epifanias que fariam a Legião evoluir de banda punk de Brasília a sucesso pop nacional.
Falei muito daquele período, o segundo semestre de 1984, em inúmeras entrevistas e depoimentos para revistas, jornais, documentários e livros. Mas nunca havia me dedicado a organizar as lembranças da gravação do disco. Até agora.
O livro Será!: Crises, Genialidade e um som Poderoso: os Bastidores da Gravação do Primeiro Disco da Legião Urbana Contados por seu Produtor – que a Máquina de Livros lança nesta sexta-feira, 30 de maio – já entrega de bandeja o conteúdo, logo de saída, no título. Ele é um pretexto para se revisitar os meses passados nos estúdios da EMI-Odeon, apoiando-se em novos depoimentos de quem estava lá: Dado Villa-Lobos, Marcelo Bonfá, Fernanda Villa-Lobos (então empresária da Legião), o técnico de som Amaro Moço e Mayrton Bahia, Diretor de Produção da gravadora naquela época.
Não é uma biografia da Legião, nem o livro definitivo sobre o grupo – não é essa sua pretensão. Na verdade, é uma história oral, a seis vozes, documentando como o disco de estreia do grupo foi semeado, burilado, lapidado, como evoluiu – e o quanto, no processo, aquele trabalho ajudou a amadurecer a banda. Tudo documentado com fotos exclusivas, históricas, de Mauricio Valladares.
Curiosamente (embora não chegue a ser supresa), as memórias dos entrevistados nem sempre se harmonizam. São, por vezes, conflitantes, até. Não é fácil lembrar com clareza absoluta acontecimentos de 40 anos atrás. No entanto, juntas elas contextualizam o tempo e ajudam a pintar um quadro bastante fiel do que se passou naquele manhãs, tardes, noites e madrugadas naquele complexo de edifícios localizado praticamente na borda do Cemitério São João Batista.
Foi uma jornada de auto-conhecimento, amadurecimento e evolução que fez aquele grupo punk de Brasília começar a se transformar num dos maiores fenômenos do pop e do rock do Brasil.
José Emilio Rondeau - 28 de maio de 2025
PLAYLIST FAROL 122
O glam rock contemporâneo do francês Arthur Satàn. Os britânicos quase New Romantics do BAMBARA. Paul Weller parte para as versões. A festa francesa do La Flemme. Hunx and His Punx doidões de ácido. Giorgio Poi no meio da luta entre o humano e os insetos. Alan Sparhawk investiga a perda. Mary Chapin Carpenter se aprofunda na Americana. O folk requintado de Tamino. E John Fogerty se regrava
Arthur Satàn – “Glamosaurus Rex”– Vai gostar de glam rock dos anos 1970 lá longe: ou melhor, em Bordeaux, na França, terra deste talentoso cantor-compositor, nascido do punk de garagem, que em seu novo álbum, A Journey That Never Was, exercita músculos pop e psicodélicos.
BAMBARA – “Letters From Sing Sing” – O single do quarto álbum gravado pelo trio britânico de pós-punk, Birthmarks, tem uma pinta dos New Romantics do início dos anos 1980,
Paul Weller – “Lawdy Rolla” – O Modfather preparou um álbum só de covers que desvenda seu DNA pessoal e musical, Finding El Dorado. Tem de Richie Havens a Bee Gees, até uma faixa obscura, gravada originalmente pelo grupo francês The Guerrillas, em 1969.
La Flemme – “La Fête”– Também francês, mas de Marselha, este quarteto foi revelado num festival organizado pela revistaça Inrockuptibles, ano passado, e agora literalmente faz a festa em seu álbum de estreia.
Hunx and His Punx – “Alone In Hollywood On Acid” – Só o título vale uma passeada pela faixa, “Sozinho em Hollywood Doidão de Ácido”, a primeira gravação lançada pelo trio californiano de pop de garagem depois de 12 anos de atividade, parte do álbum Walk Out On This World.
Giorgio Poi – “uomini contra insetti”– Pop romano sofisticado, produzido por Laurent Brancowitz, do grupo francês Phoenix, de alt-pop, amostra do quarto álbum de Poi, Shegge.
Alan Sparhawk – “Not Broken”– Em seu segundo álbum pós-Low – a dupla formada com a esposa Mimi Parker, morta em 2022 – Alan continua investigando a dor e a perda, mas agora cercado do Trampled By Turtles (nome ótimo), quinteto de folk-bluegrass progressivo. Hollis Sparhawk, filha do casal, participa com vocais.
Mary Chapin Carpenter – “Home Is A Song”– Apesar de gravado nos estúdios de Peter Gabriel em Bath, na Inglaterra, o 17º álbum da cantora-compositora veterana, Personal History, não poderia ser mais enraizado em Americana elegante. Aqui, ela se aprofunda mais ainda no gênero em um dueto com Anaïs Mitchell, cantora folk que forma o trio Bonnie Light Horseman com Eric D. Johnson e Josh Kaufman, que produz o disco.
Tamino –“Every Dawn’s a Mountain”– De raízes egípcias e criado na Bélgica, este cantor-compositor montou base em Nova York, onde produz um folk requintado, produzido por Eric Heigle, que trabalhou com Arcade Fire. Por vezes, lembra um tanto Jeff Buckley.
John Fogerty – “Up Around The Bend (John’s Version)”– A voz, o cérebro e a guitarra do Creedence Clearwater Revival entrou numa de regravar o repertório de sua antiga banda. Não são releituras, reinvenções, mas reproduções fidedignas do que havia feito antes, só que agora. O que realmente surpreende é o vigor de sua voz, que, aos 80 anos, soa idêntica ao que era quanto tinha 25.
Aviso aos navegantes: o FAROL vai fazer uma pausa técnica, para retornar, com força total, na segunda semana de julho.
Até lá!