Em celebração às formas exuberantes, voluptuosas, de Fernando Botero
A maior exposição do artista colombiano já montada na Espanha reúne em Barcelona 110 obras, algumas mostradas ao público pela primeira vez
São trapezistas, toureiros, religiosos, putas, frutas, crianças, animais, narcotraficantes, nobres, flores, caixeiros viajantes, generais e prisioneiros, todos retratados em pinturas a óleo, aquarelas, desenhos e esculturas, sempre com formas roliças, voluptuosas ou exageradamente grandes, que se espalham por três andares do Palácio Martorell, um edifício neoclássico do século 19 localizado defronte à basílica de Nossa Senhora das Mercês, no Bairro Gótico de Barcelona.
O conjunto de 110 obras – algumas delas mostradas pela primeira vez ao público – compõe a maior exposição já feita na Espanha com o trabalho de Fernando Botero, o artista colombiano de estilo inconfundível que cumpriu o desejo de ser como Picasso, seu ídolo, e trabalhar até morrer. Botero só parou quatro dias antes de falecer, em setembro de 2023, aos 91 anos.
Com curadoria de Lina Botero, filha do artista, e da especialista Cristina Carrillo de Albornoz, a mostra Fernando Botero-Um Mestre Universal celebra em grande estilo um artista cuja família esperava que fosse toureiro (ele chegou a treinar para tanto), dono de uma assinatura que marca a cidade onde está sendo montada: sua escultura "O Cavalo" virou ponto de encontro no aeroporto El Prat, enquanto outra, "O Gato", pode ser vista na artéria principal do bairro Raval.
Dentre os trabalhos jamais vistos pelo público está "A Menina", releitura de um quadro de Diego Velázquez que ele preferia deixar em seu ateliê, porque a pintura, no seu entender, ”dizia que era mais de Velázquez que de Botero”. Outro trabalho exposto na mostra e raramente visto é "Homenagem a Mantegna", criado a partir de um afresco do pintor renascentista Andrea Mantegna. No entanto, em nenhum momento Fernando se distancia de sua formação, como explicitado numa placa exposta na mostra: "a riqueza de um artista consiste na fusão das influências que marcaram sua vida e seu trabalho. Para criar um mundo único é preciso estar exposto à grande arte”.
Há muito de lirismo e afiado senso de humor no trabalho de Botero: o bispo na banheira, de roupa e tudo, com um assistente diminuto aguardando, de toalha na mão, ou as naturezas mortas. Mas são de enorme impacto também os quadros que retratam violência, da imagem de Pablo Escobar sendo baleado às poses grotescas dos presos torturados em Abu Ghraib, complexo penitenciário próximo a Bagdá, gerido por militares americanos a partir da guerra no Iraque.
“(Botero) sabia que a arte não pode mudar a realidade”, disse a co-curadora Carrillo de Albornoz, referindo-se às reproduções de crueldade humana, “mas pode deixar um testemunho. Talvez hoje ninguém se recordaria da tragédia de Guernica (cidade do País Basco bombardeada pelos alemães) se Picasso não tivesse pintado seu quadro”.
O Brasil perde um gigante do cinema. “Arte brasileira: tupi or not tupi?”. Pentágono retira livro infantil de suas bibliotecas. O adeus ao Vigilante Rodoviário. Uma ilha dedicada à cultura em Abu Dhabi.
– Um dos mais importantes e ativos cineastas do Brasil – e aqui incluem-se não apenas os filmes que dirigiu ou produziu, mas também o trabalho de bastidores que fez a vida inteira para incentivar iniciantes e independentes –, Cacá Diegues se considerava, acima de tudo, um cinéfilo, um fã. Parte do grupo que criou o movimento Cinema Novo, inspirado na Nouvelle Vague francesa e no neo-realismo italiano, do qual fizeram parte também Glauber Rocha, Paulo Cesar Saraceni, Joaquim Pedro de Andrade e outros, como eles Cacá iniciou sua carreira levando sua câmera "para as ruas, o país e as praias, em busca do povo brasileiro, o camponês, o trabalhador, o pescador, o morador das favelas”.
Ao longo de sua carreira, Cacá dirigiu filmes emblemáticos e premiados, dentre eles Bye Bye Brasil, Xica da Silva e Tieta do Agreste. Recentemente, estava trabalhando na finalização do longa Deus Ainda é Brasileiro, continuação do filme lançado em 2003 e com perspectiva de chegar aos cinemas ainda este ano. Fora das telas, integrava a Academia Brasileira de Letras – ocupando a vaga deixada por outro cineasta, Nelson Pereira dos Santos – e assinava ensaios e colunas na imprensa. Em seu último texto para o jornal O Globo, ao falar sobre a trajetória de Fernanda Torres e do filme Ainda Estou Aqui, deixou clara sua filosofia de vida, com palavras que podem ser interpretadas como uma despedida, mas que também servem de lição para a existência.
“Fazer a vida valer a pena não significa acumular riquezas ou status, mas sim viver com propósito, em equilíbrio”, escreveu. "A mensagem que fica é que a vida deve ser um palco para a expressão pessoal. Que cada um de nós encontre seu próprio caminho para fazer da vida uma honra”. Cacá Diegues morreu na semana passada, aos 84 anos.
– “Arte brasileira: tupi or not tupi?”, indaga o título da matéria de Andy Robinson para o diário espanhol La Vanguardia sobre a variedade de exposições em Londres, Paris, Berna e Bilbao que enfocam diferentes aspectos do trabalho de artistas modernistas, como Candido Portinari, Lasar Segall, Anita Malfatti e Tarsila do Amaral. “Há um aumento de interesse” pelo tema, explica Adrian Locke, um dos encarregados da mostra recém-aberta na Royal Academy, em Piccadilly Circus. “Talvez o mundo abra os olhos”.
– Escrito pela atriz americana Julianne Moore, o livro infantil Freckleface Strawberry acaba de ser retirado das bibliotecas das escolas administradas pelo Pentágono, nos Estados Unidos, onde estudam filhos de militares. Um memorando do Departamento de Defesa instruiu as escolas a remover de seu acervo, “para revisão posterior”, obras “potencialmente relacionadas à ideologia de gênero ou tópicos discriminatórios da ideologia de equidade”. Freckleface Strawberry traz uma história semi-autobiográfica sobre uma menina de sete anos que não gosta de suas sardas, mas que aprende a viver com elas ao perceber que é diferente, “como todo mundo”. A medida se alinha aos decretos recentes de Donald Trump para “dar fim à doutrinação radical de crianças em idade escolar” e “defender as mulheres da ideologia extremista de gênero”. Ironicamente, Moore – filha de um militar de carreira e veterano da Guerra do Vietnã e que afirmou considerar a medida “particularmente chocante"– formou-se na Frankfurt American High School, administrada pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos.
– Quem foi criança nos anos 1960 e 1970 e ficava ligado na programação da TV deve lembrar de O Vigilante Rodoviário, série rodada em preto-e-branco, exibida pela Tupi a partir de 1962 e, depois, em reprise, pela Globo, onde o oficial Carlos patrulhava a Rodovia Anhanguera, em São Paulo, e combatia o crime a bordo de um Simca Chambord 1959 ou de uma Harley-Davidson 1952, sempre acompanhado de seu cão, o pastor alemão Lobo. Era um contraponto raro aos enlatados da época e obteve grande sucesso, tendo sido exibido também na América Latina, trazendo no elenco futuros astros, como Rosamaria Murtinho, Ari Fontoura e Milton Gonçalves. Esta semana, morreu o ator e policial militar Carlos Miranda, o próprio Vigilante Rodoviário, aos 91 anos.
– Um dos emirados árabes pretende assumir posição de destaque na arte mundial, com a construção da Ilha Saadiyat, em Abu Dhabi, que já tem uma filial do francês Louvre e onde está sendo erguido o maior museu da marca Guggenheim – com 32 mil metros quadrados. Ao todo, nos próximos anos serão abertos quatro museus de alto nível, cada um com identidade própria, parte de um plano estratégico do Governo dos Emirados Árabes Unidos para transformar a região numa referência planetária no setor. Recursos não faltam. Declarada recentemente a cidade mais rica do mundo, Abu Dhabi gerencia um fundo soberano de 1.5 bilhões de euros, equivalente ao PIB da Espanha.

PLAYLIST FAROL 109
O rock vintage de Larkin Poe. O pau puro de Bob Mould. Ani DiFranco + Stone Gossard. Elton John + Brandi Carlile. Marshall Allen + Neneh Cherry. O pop onírico de Anna Andreu. O ritmo hipnótico de Obongjayar. A estética sixties (ou seventies?) de Matt Berry. O rock clássico de Lilly Hiatt. Ritchie + Caetano Veloso (de novo).
Larkin Poe – “Little Bit”– Com uma tremenda pinta de Bonnie Raitt, as irmãs Rebecca e Megan tecem um rock vintage que remete às rádios FM dos anos 1970, conduzido por órgão Hammond e guitarras cortantes, em diálogo constante.
Bob Mould – “Neanderthal”– Pau puro, cortesia do velho homem do pop pós-punk americano, ex-integrante do seminal grupo Hüsker Dü, com guitarras em uníssono e bateria à toda, amostra de seu novo álbum, Here We Go Crazy.
Ani DiFranco, Stone Gossard – “The Message”– A cantora-compositora americana e o guitarrista do Pearl Jam retomam uma colaboração iniciada em 2022, quando fizeram juntos a faixa "Disorders".
Elton John e Brandi Carlile – “Who Believes In Angels?”– Outra dobradinha, esta é a faixa-título do álbum que Elton gravou com Brandi, produzido pelo mesmo Andrew Watt que trabalhou com Rolling Stones, Paul McCartney e Eddie Vedder recentemente, e com letras de Bernie Taupin, colaborador de John em seus anos áureos. Who Believes In Angels? sai em abril.
Marshall Allen – “New Dawn” – E olha mais uma gravação feita em dupla, dessa vez entre um veterano da Arkestra de jazz cósmico do maluquete Sun Ra e a vocalista Neneh Cherry. É parte do primeiro (!!!) álbum individual do multiinstrumentista Allen, hoje com quase 100 anos de idade.
Anna Andreu – “Turons“– Single onírico do terceiro álbum da cantora-compositora-instrumentista catalã, o recém-lançado Vigília, aqui acompanhada pela voz da conterrânea Mar Pujol.
Obongjayar – “Not In Surrender”– Nigeriano baseado em Londres, Obongjayar criou uma faixa dançável hipnótica que se move através de percussão eletrônica, riffs de guitarra e intervenções de teclado.
Matt Berry – “Silver Rings”– Dividindo os dias entre seu trabalho como ator de comédias e a música, o britânico Matt tem um pendor especial por resgatar sonoridades e a estética dos anos 1960 e 1970, como se ouve em seu décimo álbum, Heard Noises.
Lilly Hiatt– “Ghost Ship”– Filha do craque John Hiatt, Lilly não se afasta muito da linhagem familiar e mostra na faixa de seu novo álbum, Forever, um rock americano clássico e ganchudo.
Ritchie – “Shy Moon”– Em 1984, quando cavalgava a crista de seu imenso sucesso, Ritchie foi convidado por Caetano Veloso para duetar com ele numa canção em inglês que seria incluída no álbum que o baiano estava gravando. Agora, quatro décadas mais tarde, os papéis se inverteram, com Caetano sendo o convidado de Ritchie para uma releitura da música. O anfitrião imprime um vigor extra na interpretação, quando antes havia optado pela suavidade.